quarta-feira, 15 de setembro de 2010

domingo, 5 de setembro de 2010

VIÚVA NEGRA

Mais uma noite comum e ordinária. A mesma rotina de sempre.
Cansada de ficar em casa, se levantou, tomou um banho ligeiro e, depois de se vestir, passou ao ritual demorado e falho da maquilagem.
Começou com um creme de cor repugnante e cheiro mais repugnante ainda. Por cima colocou uma base mais escura que sua pele, o que lhe dava um ar de pessoa velha e vulgar. Na dúvida entre que sombra usar acabou escolhendo uma de cor forte e vibrante, o que vulgarizou mais seu aspecto. Por cima dos cílios postiços presos com cola barata passou o rímel negro que aprofundava suas olheiras. Duas rodelas alaranjadas ornavam sua face e sua boca, completando o quadro de horrores formado, reluzia em um vermelho sangrento e provocante.
Olhou a imagem produzida pelo espelho e, muito satisfeita, fez um sinal de aprovação. Saiu.
Não tinha aonde ir, nem tampouco a quem encontrar. Pensou e resolveu andar na praia mesmo achando sua produção muito pouco adequada.
Chegou a Copacabana por volta de 22h. A praia estava deserta e o vento vindo do mar era gelado. Achou engraçado não encontrar nenhum velhinho passeando com cachorros. Não se deu conta do horário.
Caminhou por quase toda a orla e decidiu que queria dançar. Resolveu pegar o metrô e ir para a Lapa.
No caminho foi confundida com uma prostituta e se sentiu ofendida por não terem percebido toda sua classe e elegância. O vestido "tubinho" preto e a maquiagem perfeita, além da sandália de marca, caríssima que comprara em um dia de loucura, mostravam seu bom gosto.
Pegou o metrô e se sentou entre uma senhora que levava seu filho, provavelmente para a igreja, e um senhor, bem idoso, que não parava de olhar suas perna e piscar. A senhora, que não parava de encará-la e dizer coisas indistinguíveis se levantou, sentou-se no banco oposto e, visivelmente incomodada, resolveu descer na estação que se aproximava. Mais uma vez não compreendeu o que fazia com que pensassem mal de sua pessoa.
Chegou na Cinelândia e começou a caminhar em direção aos Arcos. Quando estava em frente ao Goethe um rapaz distinto e bem arrumado lhe abordou. Achando-o interessante, começaram uma conversa e seus passos solitários passaram a ser acompanhados.
Andaram até os Arcos e pararam.
Um samba tocava e, ao redor do som abafado das vozes que sumiam misturadas ao barulho dos instrumentos, pessoas se aglomeravam e se sacudiam em uma espécie de dança sensual e ritualística que lembrava Baco.
Resolveram parar ali. Beberam, dançaram e quanto mais dançavam mais ela se sentia envolvida por ele.
Começaram a flertar. Carícias foram surgindo e a intimidade se tornando maior. Quando o desejo chegou ao seu ápice, resolveram ir a um lugar mais discreto.
Não era do tipo de mulher que se envolvia facilmente, mas precisava daquilo. Queria se entregar a alguém que lhe desse valor. Como era precavida sugeriu irem para a parte traseira do "Circo Voador", perto das árvores. Assim estaria segura. Foram.
Pararam perto de uma árvore e começaram a se beijar de forma dura e vigorosa. O sexo se fazia iminente e deixava seu cheiro no ar. As mãos se entrelaçavam como que para evitar a fuga. Suspiros sôfregos se faziam ouvir. Suor e saliva escorriam pela pele.
A mão livre do distinto cavalheiro subia e descia por seu corpo suado reconhecendo cada parte do território. Ela tremia de desejo e se dava como se fossem almas gêmeas.
Ele levantou o vestido, puxou sua calcinha para baixo e a penetrou. Sua vontade era tão grande que não pode se conter por muito tempo. Gozou. Estava feliz. Tinha reencontrado o amor depois de acabar o relacionamento anterior de forma tão cruel e dolorida. Motivo suficiente para recuperar seu vigor. Ela se arrumava enquanto ele se preparava para continuar. Achando ser correspondido, esperava calmamente. Ela abriu a pequena bolsa de mão e dela sacou uma faca de caça. Ele, distraido, não notou. Ela o chamou e ao virar, de um único golpe, decepou seu pênis.
Desesperado com a dor e pela traição tentou gritar, mas a dama de negro foi mais rápida e com um corte preciso acertou sua jugular. Seus movimentos pareciam treinados. Esperou o sangue jorrar e o corpo cair, inerte. Limpou sua faca, recolheu o pênis que envolveu delicadamente em um lenço de seda bordado com flores rosas e saiu, contornado o "Circo", cantarolando a música que ecoava ao longe.
No dia seguinte os jornais noticiavam: "Viúva Negra ataca outra vez.". E ela, distinta e elegante se preparava para mais um dia de trabalho na casa de massagem.